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terça-feira, 20 de agosto de 2013

Instante de 'estranhamento' para o quadro 11 (Ela assobiando nos olhos dele)

Um mar negro inundando aquilo que você não reconhece como nosso. Os pulmões plenos, robustos, ecoam no concreto, balançam os pilares do que está posto, estilhaçam as vidraças do impossível. A malha urbana está puída, um horizonte de fios desencapados propõe novas tramas. E eu estou aqui, lisa, melodicamente nua. Absoluta no silêncio. 

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Instante de 'estranhamento' para o quadro 6 (O momento em que ele sequestra ela)

Não está lá um corpo estendido no chão. Amarildo, Rocinha, Maré, Guanabara, Palácio. Tá aqui, aqui!

REFERENTE AO BLOCO 8

Porque quero que pare. (Pare!) Faço um exercício de esperança.
É preciso reconhecer, é importante e bonito reconhecer.
Revanche é diferente de vingança. Uma criança de 9 anos que pede uma revanche contra uma de 13 não quer revidar as agressões, quer justiça.
Desproporcional.
9 e 13 anos traz uma diferença de força desproporcional. É mais fácil se acovardar. Qual é o problema de se acovardar se a diferença de força é desproporcional?
Acontece que a covardia prorroga o que a fisiologia precisa fazer seguir agora! Então continuamos a ser assombrados pelos fantasmas. (Pára!!)
Porque quero que esses fantasmas parem de assombrar eu peço revanche.
Se eu pudesse voltava no tempo e batia no menino que tinha 13 anos e me bateu, mesmo eu tendo 9 anos de idade. Ele já tinha bigode e eu bateria até cansar. Pra exorcizar a covardia.

domingo, 18 de agosto de 2013

Especulando algo em torno de uma ficção para a dramaturgia cênica.

ELA Eu vi um homem em chamas
correndo desorientado rumo a uma rua sem movimento
Eu posso ainda gora ouvir os seus gemidos
ele estava derretendo
arrancou o casaco, as botas já derretendo
e se livrou do fogo, que consumia em fogueira
o resto da sua identidade
tudo frito e tornado cinza
no chão do asfalto.
Eu me aproximei dele, foi preciso correr um pouco
e perguntei se ele precisava de ajuda
Eu estava com a minha câmera pendurada no corpo
ele olhou a câmera
mirou meu rosto
e resmungou o peito queimado, ainda soltando fumaça
Os olhos dele estavam fechados, escuros
talvez, eu pensei, também tivessem se queimado
Eu olhei o homem pós-chama jogado ao chão
bonito, delicado, queimado
eu olhei em seus olhos
e estendi meus dois braços
ele me respondeu, imediato, agarrando-me e se erguendo
fazendo meu corpo como apoio
Depois saiu mancando, me deixando parada
se aproximou do chão, onde seu casaco queimado soltava fumaça
e o ergueu
Foi então que eu vi brilhando
feito estrela
a condecoração do militar que em chamas
por alguns minutos
se perdeu da exigência de ser em si próprio a truculência
Continuei parada, não acreditando que fosse possível o que viria a seguir
Ele então arrancou sua medalha, acomodou-a ao chão
e saiu mancando
com o casaco puído de militar
querendo se passar apenas por um mendigo qualquer
disposto a morrer
mas não a matar
não mais.

Afirmação a partir do quadro 4

Muitas indagações:

O que ou quem gera toda essa energia que corre solta pelas ruas de várias cidades em todo o país? Em todo o mundo?

Alguma paixão deve haver para costurar tanto movimento parecido, não pode ser tudo coincidência. Que busca é essa que não tolera um nome, mas que segue acontecendo e exigindo aos corpos algum reconhecimento?

Tirando as máscaras, o gás lacrimogêneo, tirando o vinagre, tirando tudo isso e deixando apenas um homem e outro homem em meio a uma rua movimentada da cidade (da qual também os carros foram tirados). Deixando apenas o ser humano olhando para si mesmo, como pode haver diferença? Como pode haver domínio? Superioridade?

Restam homens, policiais e bandidos, munidos de suas armas (as armas que escolheram para ler e escrever o mundo). Ao mesmo tempo, saindo todo o aparato, que nos parece querer dizer o que está acontecendo (silêncio também nos helicópteros), tirando tudo isso sobramos novamente humanos. Em quais lugares nos colocamos que não podemos sair?

Que profissão, que função eu desempenho ao mundo que não seja destinada somente a mim? Eu penso sobre o que eu faço em relação ao mundo, em relação ao outro? Eu penso no tiro que eu darei, se ele tem motivo, eu penso além das ordem e das obrigações dos distintivos? Eu quero pensar. Eu não posso não pensar. Eu preciso dizer que o nome aprisionou uma legião de homens. E que agora lutam agitadamente dando-se tiros e tentando escapar do sentido que lhes foi imposto apenas pelo uso daquela roupa, daquele colete, daquela arma, daquele capacete.

E se mudarmos as roupas? Resolveríamos nossos papéis? E se ficássemos nus, veríamos como somos mais parecidos?

Em linhas afirmativas:

Fomos acostumados a cumprir funções muito determinadas. Desempenhar nosso papel, nosso ofício. Para tanto, tornou-se preciso deixar claro que eu não sou como você, foi preciso manifestar que eu tenho certas características e habilidades que você não tem. Foi preciso inventar diferença. Mas quando eu chego em casa e tiro meu uniforme – minha armadura – eu me vejo sempre tão menor, eu sou tão mais possível e tão mais feliz, porém, não há ninguém ao meu lado com a pele tão exposta para que eu possa me reconhecer. Então eu saio nu, por exemplo, no meio da noite, eu saio nu e sou considerado louco, sou chutado tal qual fazem com mendigos, índios e cachorros (seres que tem apenas a própria pele como barraca). Eu ainda estou dentro de casa. Me obrigando a perceber que é possível atravessar o nome e o uniforme e ver o que há na superfície entre dentro e fora. Isso não é uma pergunta. Talvez seja antes uma solução para o momento. Eu quero dizer: se eu quiser, eu consigo ver além das letras, ver além dos quimonos. Eu consigo - desde que eu queira - saber o que é gente, saber o que é apenas palavra, sentido, nome.
 

sábado, 17 de agosto de 2013

16 | O primeiro encontro.

Ela tenta ir embora.

ELE Aonde você vai?
ELA (se detém) O tom de certas palavras sempre remete à imagens...
ELE Sempre te perguntei aonde ia... absolutamente sempre, em nossos tempos... aqueles tempos...
ELA Aqueles tempos...
ELE Eu era possessivo. Reconheço. Antes de te conhecer, já achava que você me pertencia. Seu nome me pertencia... Enfim, eu brincava de que você me pertencia... Ainda quando eu não te conhecia, quando você era só um nome... me obcecava a idéia de te possuir... me apoderar de você como um troféu, sempre pensava em teu corpo... Me apossar de repente... de imprevisto... igual a um animal, quando caça sua presa... te invadir... assim...

ELA E por que tantas verdades... Hoje? Por acaso, algum outro jogo de intensidades?

15 | Ele espera enquanto ela está desacordada.

ELE A vida nos lança no vazio e nós dizemos no ar “vou por este caminho, escolho este outro, me equilibro entre aqui e ali”.
Bem que eu queria explicar os fatos, as circunstâncias desencadeantes, explicar as causas. Dizer: esta atitude eu posso explicar deste modo. Só posso dizer que sou absolutamente responsável por tudo, não me arrependo absolutamente de nada, minhas atitudes são a única coisa que faz algum sentido, um fio para seguir... Sou responsável por cada uma das minhas intensidades... isso é certo... absolutamente certo. Essa é minha certeza.
Qual era o problema? Agora o tempo modifica tudo, acho que o tempo modifica tudo.

14 | Ela esmorece. Ele a ajuda. Ele não permite que ela desista.

ELE Me lembro do dia, hoje eu posso te dizer que você sempre me impressionou, tenho a imagem de uma discussão ou de algo parecido com uma discussão... como um mal-entendido ou alguma coisa assim.
São retalhos, é verdade que antes de nos conhecermos... eu tinha recriado uma imagem sua... quero dizer que você me era familiar... Quando alguém me falava de você... me sentia misteriosamente atraído pelo que se falava de você... malgrado minha vontade, às vezes me pegava escutando... às vezes entendendo pela metade... às vezes tentando acompanhar uma seqüência, para entender melhor...

Você me despertava uma grande curiosidade... sempre me dava curiosidade...

13 | A tertúlia pós-sexo.

ELE Quantas vezes eu perguntei qual seria a melhor forma de te conhecer ou de me fazer conhecer, qual seria a melhor colocação, a que menos pudesse confundir ou simplesmente
te incomodar, te encher, às vezes nos tornamos complicados
não é fácil para mim falar agora, quer dizer, voltar a recordar se te digo que você foi minha única obsessão antes de te conhecer, você tem que acreditar em mim, se te digo que hoje você é minha obsessão você tem que acreditar em mim
seria absurdo que hoje eu tentasse perguntar além do que você pode me responder
e antes eu evitava te perguntar coisas que pudessem te chatear além do necessário...
mas hoje se trata de um vínculo, de uma história, de uma experiência humana compartilhada com toda intensidade
disso não podemos nos arrepender
se alguma coisa pode definir nossa história
foi a intensidade do compartilhado.
É verdade que eu às vezes era brutalmente possessivo
queria conhecer até seus mais íntimos pensamentos
não podia tolerar que houvesse algo que eu desconhecesse
Talvez a intensidade estivesse nesses momentos em que pensava que havia algo seu que existisse fora de nós
Esta porção de sua intimidade que eu não podia alcançar nunca me desesperava
Talvez isso eu nunca tenha podido te dizer, mas a meu favor posso afirmar que eu não o sabia, quer dizer, há muitas coisas da nossa relação que só agora eu posso compreender.
No princípio eu estava todo dominado pela obsessão de te conhecer
de me apoderar de tudo seu
de cada um dos teus interstícios
porque possuir-te não era só uma questão física, você bem sabe mas te possuir toda inteira, tua intimidade, o mais incomunicável é essa sem dúvida minha verdade de hoje.
Você há de imaginar que esse clima me impedia todo tipo de sensatez
os anos, talvez um pouco mais de amadurecimento, o tempo que tudo cura
permitiram que eu me colocasse de outra maneira frente às nossas coisas
mas é curioso, se por um lado me tornei mais sensato e compreensivo, a zona de mistério que ainda hoje não consigo desvendar me parece mais atormentadora agora do que antes
Porque antes todas nossas coisas pareciam que faziam parte do mistério.
Hoje eu posso chegar a compreender alguma coisa, me parece ainda mais incompreensível
aquilo que ainda não posso decifrar
ELA Necessidade de te contar coisas, palavras que crescem quando juntos
apesar de você e de mim
apesar de nossa história sempre tão diferente, tão horrivelmente diferente
só crescem
não por você e por mim
brotam sempre palavras onde só deveria existir o grande Silêncio das gritarias
cresce a lembrança apesar dos dois
que estranho espaço teremos inventado
que às vezes não posso deixar de te falar malgrado minha vontade...

12 | A tertúlia pós-tortura.

ELA Talvez fosse bom recomeçar, mas tomando em conta o trabalho já realizado.
Não é o caso de atirar tudo pela janela.
Às vezes é tão fácil esquecer cada um dos detalhes, cada uma das intensidades, por isso acho que cada momento que repetimos se transforma numa verdadeira descoberta.
Temos que procurar recordar cada detalhe dos acontecimentos com a mesma intensidade original, você não acha?
Primeiro transformamos experiências vividas em conceitos e com os conceitos nos afastamos das intensidades.
O problema dos conceitos é o esquecimento das intensidades, o esquecimento da experiência da vida, você não acha?
Falamos de coisas, de palavras que aludem a outras palavras, temos que voltar para as intensidades,
Voltar a recordar tudo segundo a segundo com nossos corpos
que não se esqueça de nada,
nada de nada,

ELE Me falta ar
ELA Quanto?
ELE Quanto quê?
ELA Quanto de falta, um litro, dois litros, você sempre foi muito preciso, por que não há de sê-lo agora?
Temos que reconstruir cada detalhe, cada instante,
senão se esquece tudo
é tão fácil esquecer...
ELE Pára que eu me sufoco, poderia te bater me falta ar

[...]

ELE Tudo explode
A desesperança não é um diálogo triste, mas sim o estalo de um Silêncio ensurdecedor.
Isso que hoje eu sinto por você
Recorte de nossas caras... de nossos corpos.
Teu corpo aqui, o que você foi, o que você é
hoje aqui, o que te dizer, meu Deus, o que posso te dizer?
Te pedir desculpas por tudo?
Não, não posso te pedir desculpas, você não permitiria
continua sendo a mais forte!
Mas por quê?
O que tem o seu corpo que hoje você ainda é a mesma?
Com a mesma força que ontem
e eu tremendo na sua frente
sempre tremendo,
Isso que eu toco que é você e não é você
primeiro foram os corpos
até onde chegaram
os vazios... sem espaços
agora a calma das intensidades
é o vazio que não tolero...
“o horror era saber que a intensidade podia terminar de repente”, se lembra?
Aquilo...
Isto, sem outro nome que ISTO tão concreto
onde começo, onde termino
onde você começa, onde você termina

[...]

ELA Pensei que você me conhecia. Esse foi seu grande erro. Você pensava que tinha chegado a me conhecer e agora sofre porque não sabe com quem esteve tanto tempo, tantas horas e aí é onde seu pequeno tormento te fala de tantas horas equivocadas
Tanto trabalho malfeito, algo que não estava previsto
você pensava que a intensidade faria desvendar até o mais intimo do que mais se preserva na intensidade, sempre alguma coisa fica protegida
o indivisível no momento da gritaria e dali essa intimidade se agiganta porque o íntimo se converte no último baluarte para se preservar.

Ali se joga a SOBREVIVÊNCIA

[...]

ELE Por que sempre as evasões ganhando em teu Silêncio?
E queria que você gritasse todas as verdades
que me olhasse mais em teu Silêncio...
Se você pudesse me insultar, quebrar a calma, perder o controle um momento, apenas...
se você pudesse falar de nossa história, de toda nossa história... da verdade da nossa história compartilhada.
Você não falou antes e não quer dizer meu nome agora
quem sou eu então?
Você me olha nos olhos como antes me olhava quando eu te dizia a pergunta que nunca me respondia.
Cheguei a te pedir que inventasse nomes que eu só necessitava um nome inventado só para que você dissesse algo para ter um nome entre você e eu alguma coisa que nos pertencesse o nome era tua entrega qualquer invento era legítimo e o importante chegou a ser que você jogasse de ceder, nem sequer eu pedia que cedesses... que brincasse apenas...
só um invento uma brincadeira entre os dois cansei de te pedir realidades
mas você nem sequer me concedeu o “jogo” tua ética não permitiu não te peço muito... apenas que me tenha como parte da sua história porque foi importante, não?
Nosso caso foi?...
Por que você não me denuncia filha da puta?
Confessa meu amorzinho grita bem alto para que todos ouçam quem sou eu, grita alto que eu te fiz
você é sempre a mesma merda de antes e agora
te peço que diga a verdade
que conte o que eu te fiz
necessito isso para mim
é o meu triunfo

11 | Ela assobiando nos olhos dele.

ELE Me apoderar do seu corpo, dos buracos dos seus cheiros
cada zona do seu corpo que eu golpeava
sabia a cor de cada um dos hematomas
antes tinha algum sentido, diziam que eu não conseguiria te tirar nenhum nome nunca...
agora não te entendo você pode gritar meu nome para todos e outra vez prefere calar e não falar
confessa filha da puta grita quem sou eu quem fui grita o que aconteceu entre nós não me negue mais.
Porque eu existi. Eu fui.

Por quê? Por quê? Por que não diz o meu nome?

10 | Ele bate nela.

ELA Agora é o momento.
Talvez possamos reconstruir
as palavras nos servem para esquecer, muitas vezes tentamos falar para esquecer.
Lembra-se daquelas longas tertúlias nas quais falávamos para esquecer o que tinha acontecido?
Cada frase que dizíamos sepultava cada acontecimento.
Tentávamos esquecer o que tinha crescido entre nós
é disso que se trata
de reconstruir tudo
o mistério de cada acontecimento no detalhe.
Por acaso se pode falar de tudo isso?
Se pode falar da morte, da dor sem evocá-las com a proximidade dos nossos corpos, ou simplesmente evocamos tudo isso para esquecer os horrores e para transformar o horror em palavras que já não significam nada
Te sufoco, te faço mal? Passa o ar?
A traquéia ainda resiste?
Quantos sufocados?
Agora sim, estamos juntos, quantos com a cabeça no barro?
Sem poder respirar
Corpos nus, mutilados, agora sim estamos juntos
Agora sim, agora sim.

Podemos recordar juntos, você não acha?

9 | Quando ele a despiu.

ELE Nós sabíamos aproveitar o tempo... Eu tinha pedido para te ver, assim que fiquei sabendo que... Bem, que íamos nos conhecer... Me lembro desse dia, o primeiro encontro, esses seus olhos, tão incrivelmente perscrutadores e tão belos sempre... Perguntei seu nome, você disse alguma coisa como Carlomagna, comecei a rir, você riu, acabamos rindo os dois por um bom tempo, não tínhamos nos falado, mas em compensação o riso dos dois foi nosso primeiro selo de encontro.
Você deixou de rir e me olhou, acho que me disse não é necessário, te perguntei não é necessário? Você disse que não é, eu te disse necessário o quê Você disse não é, pedi que falasse claro que eu começava a me irritar, você disse que não tinha culpa se eu não entendia, que você falava pouco, que ia falar muito pouco e que não se sentia responsável pelo que eu não fora capaz de compreender, que eu não compreendia que te dissera nada, respondeu, incrível, disse, eu você é incrível e comecei a rir a gargalhadas
você me feriu no orgulho
você me feriu no orgulho
não sabia se estávamos brincando nossa primeira brincadeira, não sabia se os dois participávamos do mesmo jogo, como eu te sabia inteligente, suspeitava que você jogasse o jogo sozinho e que eu fizesse o papel de imbecil, rindo sozinho. Parece que você disse que eu estava nervoso ou alguma coisa assim, havia uma precisão em suas palavras, quer dizer, o que você falava era muito exato.
Se falava sobre suas contestações, sobre suas respostas rápidas e lúcidas...
te confesso que estava prevenido, tinha me dito que o importante para estabelecer qualquer tipo de conversação com você era não te olhar nos olhos, que eu falasse sem olhar para você
porque se o fizesse ia cair na sua rede, entende?
Suas pouquíssimas palavras, a necessidade de não ter que explicar nada
Seus Silêncios nos momentos mais difíceis, que poderiam aludir a tantas coisas...
suas saídas insólitas que aprofundavam ainda mais o mistério de nossa existência

[...]

ELA Não quer um copo de água? Não tem sede?
Paramos aqui ou continuamos?
Você está cansado.
Recomeçamos ou paramos por aqui?
É que um trabalho tão intenso deveria às vezes levar em conta a fadiga física.

Mais um pouco de água? Quanto faz que você não come?

8 | O único instante em que gargalharam.

ELA Somos, fomos, você e eu, nossas histórias, nossas certezas.
Nossa maneira de sentir as coisas, disso não podemos nos arrepender
Cá você, lá eu,
é a distância que nos ajuda a nos reconhecer
que mistério é o que se cruza entre nós dois
fazendo-nos esquecer tanto passado quem sabe se somos tão diferentes
o que terá crescido tanto entre nós dois?
alguma coisa que não entendo, alguma coisa mais além que me faz
sentir ambígua e que me produz terror ter sentido piedade em algum momento
Como foi que surgiu, apesar de mim, isto da piedade entre os dois como piedade converter-me em piedosa eu que nunca o fui
ELE Um domingo de tarde eu tinha ido te visitar e tinha levado torta de ricota que você gostava, porque tinha me dito um dia
Você perguntou quem era meu pai
Meu pai?, disse eu, me ouviu bem, me disse eu não sei quem era meu pai, te disse, sabia, me disse, e depois de provar a torta perguntou e tua mãe? Minha mãe, sim, eu conheci bem
Imaginava, disse você
curioso, do meu pai eu só tenho lembrança, uma lembrança que sempre me volta...
como se toda a relação com meu pai se revelasse através dessa lembrança
eu tinha perto de nove ou dez anos
tinha chegado em casa chorando, porque uns meninos tinham me batido na rua
meu pai perguntou que idade tinham os meninos
eu disse que eram maiores que eu, que tinham doze ou treze anos
me disse que queria vê-los, prometeu que não ia se meter com eles que só queria vê-los
fomos juntos caminhando até a praça onde a turma em geral se reunia. Estavam lá. Não nos viram. Papai perguntou qual tinha sido o que tinha me batido.
Mostrei um deles o maior deles para mim, que tinha bigodes
meu pai me disse e esse idiota te bateu?
Vai lá e bate nele agora mesmo
eu não vou deixar que nenhum outro menino se meta
anda e fala para ele que você veio bater nele sozinho
eu olhei o menino de bigodes, me pareceu maior que nunca tive uma sensação física de debilidade enorme, sentia que ia desmaiar, tremia de medo...
Você tem que brigar com ele, anda, o garoto jogava bolinhas papai estava impaciente com minha covardia, anda não seja cagão
anda vai e bate nele
e quanto mais papai insistia mais eu me aterrorizava.
Agora é o momento, anda e diz que quer brigar com ele sozinho, sem os amigos, que você quer bater nele sozinho você vai ver como se encolhe, certeza que vai se encolher.
Eu não saía do terror, tinha a impressão de que era muito maior e muito mais forte do que eu, mas papai insistia.
Para mim essa cena não acabava mais, foi eterna
é provável que tenha durado apenas um ou dois minutos
só sei que num momento disse pro meu pai
quero ir embora pra casa, não tenho coragem
Certeza que não tem? Me lembro de seus olhos. Sua expressão desembaraçada, sua frustração infinita. Seu filho era um covarde.
Não podia acreditar, não tenho coragem é maior do que eu lhe disse...
não, não é maior, se você não tem coragem não se engane a você mesmo e vamos para casa... e voltamos caminhando em Silêncio junto.
Ainda depois de muitos anos, sempre tive a sensação de que papai nunca me perdoou essa covardia...
que marcou nossa relação para sempre. Esse dia permaneceu oculto entre nós
vergonhosamente silenciado e cúmplice.

Foi a marca por onde transitou nossa história.

7 | Ela no segundo anterior à morte.

ELA Você sabe por quê?
ELE Por quê?
ELA Eu pergunto se haveria em você algum tipo de convicção, pelo menos nos primeiros tempos, quando nos conhecemos, nos começos.
ELE Convicções, convicções...
ELA Idéias, simplesmente idéias.
ELE Eram apenas nossos encontros que modificavam tudo... Custei a perceber isso. Porque você se transformou em NECESSIDADE para mim. Necessidade dos nossos corpos... juntos. Necessidade de te ter perto, de falar com você próxima, sempre perto. Tocando sempre em você...
ELA Alguma convicção você deve ter tido em algum momento. Pelo menos para distinguir o verdadeiro do falso.
ELE O verdadeiro do falso?
ELA Para saber se o que você fazia tinha algum sentido, por exemplo.
ELE Sempre pensei que se faziam as coisas porque se tinha vontade de fazer.
ELA Só por isso? Por mais nada?
ELE Por que você pergunta tanto?
ELA Porque estou cheia de perguntas.
ELE Sobre mim.
ELA Sobre os dois.
ELE Quando eu estava na sua frente, descobria a intensidade. Deixar de estar com você era enfrentar o vazio, era horrível saber que a intensidade poderia terminar num só instante... que só dependia de você. Tinha medo que você cedesse e que tudo terminasse assim, de repente.
ELA Pronto?
ELE Não podia deixar nenhum detalhe da cerimônia, nenhum detalhe do ritual.
ELA Nada mais era importante, só a intensidade? Cada uma das ações de cada pergunta procuravam então silenciar, ou esperavam respostas equivocadas? É difícil acreditar, no entanto... tudo para justificar a intensidade. Cada instante, então, dessa cerimônia era apenas uma simulação? Para justificar os encontros, cada encontro uma simulação?
ELE Depois de um tempo, cada um de nossos encontros foi simulação.
ELA Cada um dos gestos de todo o ritual da cerimônia, do ritmo geral, todo aquele aparato, a importância dada a cada uma das perguntas? Foi simulação para todos? Sempre?
ELE Só para mim que era uma simulação. Chegou um momento em que eu desejei que alguma coisa falhasse... para justificar outros encontros. Amava sua fortaleza, era a única coisa que assegurava a continuidade.
ELA Se eu de repente cedia...
ELE Era cair, então, no imenso vazio do tempo presente, tomar contato com a consciência... Vivia das expectativas do próximo encontro.
ELA Eu soube, desde o primeiro dia.
ELE Como, desde o primeiro dia?

ELA Porque percebi que não te interessavam minhas respostas, mas sim o tom em que você formulava suas perguntas.

6 | O momento em que ele sequestra ela.

Silêncio.

5 | Ele fazendo curativos nela.

ELE (enquanto fala deve realizar todos os movimentos sugeridos pelo texto) Olhando para a frente. Talvez de perfil. Agora olho na minha mão. Viro a cabeça para a direita, agora para a esquerda, posso olhar outras vezes para a frente. Pausa. Não. Tenho que fazer alguma coisa, golpeio meu joelho esquerdo. Me levanto. Me sento. Coço o nariz. Trato de que cada gesto tenha sentido, quer dizer, que adquira uma dimensão de espontaneidade. Não quero vazios. Olho para a frente, bruscamente para trás. Me agrada olhar um ponto fixo. Me sustenta. Lustrada de sapato nas calças. Necessito de mais atos. Uma boa massagem no pescoço, rotação de cabeça. Tudo como se fosse normal. O tempo se deteve. Um bocejo, outro bocejo, um leve sorriso, uma penteadinha, coçada na testa, batidinha de sapato no chão. Assobio. Assopro. Vou ao banheiro. Não estou com vontade. Volto. Me sinto bem. É preciso aprender a se sentir bem. Olho o teto. Como falta ainda, meu Deus! Lustro outra vez o sapato direito. Faço de conta que penso em algo concreto que me preocupa. Faço gestos de quem descobre alguma coisa. Assumo uma cara de safado. Imagino que me lembro de uma aventura amorosa. Imagino os lugares. Me distraio um momento. Volto ao vazio. Não! Quanto falta? Penso em minha mãe. Tento reter a imagem do rosto da minha mãe. Me lembro. Me coça o nariz. Deixo que me coce... para ganhar tempo enquanto me coço. Me coço um pouco. Me esfrego. Uma pausa depois de tanto esforço. Que fazer, meu Deus! Um pouco de esperança. Dura pouco. Agora, desesperança. Finjo que esqueço uma coisa e agora me lembro. Abro a boca. Fecho. Tusso. Tusso duas vezes. Tusso três vezes. Agora finjo que me sufoco. Faço de conta que me recupero. Como continuo? Quanto falta? Mudo a cadeira de lugar. Torno a mudar a cadeira de lugar. O tempo não passa. Me sento no chão. É bom sentar no chão, muito bom. Ando. Paro. Ando. Mexo os quadris. Sou homem. Sou mulher. Sou criança. Sou animal.
Que pretensioso! Um pouco de representação, um pouco de humor, de bom humor, de humor fino, de humor inglês.

Pausa. Pausa. Pausa. Comecemos outra vez. O que acontece se eu me deixo ficar? As imagens se detêm. As caras como imagens sem dimensões. Tudo plano. Talvez um pequeno discurso, ou melhor, um método, algum recurso que pudesse me distrair... Pausa. Quanto falta, meu Deus! Como demora... tudo isso demora muito... pensar eu não posso... já gastei o pensamento de sustentação... preciso de altos, ações... 

4 | O domingo de tarde com torta de ricota.

ELA Lá, nas nossas intensidades, focos de luz deformando nossos rostos, a maca em posição inverossímil, a eletricidade e seu protagonismo, as pancadas secas, algodões e o cheiro de sangue coagulado, desafio aos limites de hoje e um pouco mais, a música que parecia nascer dos nossos próprios corpos. Agonias, os suores frios, a morte espreitando, tudo isso reunido entre nós, objetos com força própria, movimentos diferentes e ali nossos corpos, fazendo parte de tudo isso. Nos enganamos quando pensamos que nós é que gerávamos as paixões e a energia, porque quando todo o dispositivo desaparece nos encontramos só com nossa nudez, você e eu, descobrimos com horror que as paixões tão nossas faziam parte da cenografia do acontecimento. Por isso hoje só você e eu enfrentamos o vazio da perda do sentido, e isso é insuportável. Na minha memória só ficou disso tudo a lembrança dos movimentos.

3 | Ele se preparando para conhecê-la.

ELA Não direi o seu nome. Você preferiria que eu te denunciasse, que contasse tudo
Sei que assim você se sentiria melhor orgulhoso de que todos soubessem que me bateu.
Você quer ser herói como todos os demais orgulhosos outra vez do que fizeram
orgulhosos de andar soltos desafiando e ameaçando sempre... outra vez heróis...
você é muito deturpado e não vou dizer nome você vai seguir esperando... esperando sempre...
será esse seu pequeno tormento te conheço bem
é a única maneira de estar prisioneiro não vou falar
não te conheço você é irreconhecível mais um de todos ELES
você quer ser herói e se sente herói e se sente anônimo...
Vou ficar em Silêncio. Meu Silêncio é sua prisão. Meu Silêncio são os gritos em sua cabeça ali ninguém vai poder te soltar
você sabe que não
ali você continuará esperando sempre
prisioneiro dos gritos prisioneiro dos pânicos
talvez algum dia quem sabe ou talvez nunca
porque agora o tempo é meu.
Não vou falar,
Não vou te fazer HERÓI nunca
você vai continuar esperando fechado no meu Silêncio.

Não vou dizer o seu nome...

2 | Quando todo o dispositivo desaparece.

ELE Não tem razão de ser, não faz sentido.
No momento oportuno você a assobiava.
Pensei que poderia ser o começo de alguma coisa entre você e eu
como um aviso que insinuava algum próximo encontro
pensava que o assobio podia corresponder a algum estímulo e que talvez cansada de você mesma, de teu Silêncio, você começasse a assobiar como uma forma primitiva de diálogo.
Lembro minhas esperanças, minhas promessas, minhas expectativas.
Você continuava assobiando, sempre me olhando nos olhos, nunca deixou de me olhar
você começava a fazê-lo com mais força, com mais ritmo até que parou em uma longa pausa. Eu, tremendo, perguntei se você queria dizer algo e você não respondeu, te ofereci um cigarro, acho que já aceso, esperava algum gesto mínimo de reconhecimento, alguma coisa que me permitisse intuir seu possível interesse, como uma trégua
minha mão e o cigarro ficaram no ar
você não respondeu nem pegou o cigarro e continuou assobiando

enquanto seus olhos me seguiam, apaguei o cigarro e pensei que talvez não tinha chegado ainda a oportunidade do nosso encontro

1 | Ela está solta e oferece um copo de água para ele. Ela simula uma situação de cuidado.

ELE Quem
ELA Ela
ELE Ela quem
ELA Quem ela
ELE Quem ela quem
ELA Ela quem quem
ELE Eu falo sério
ELA Quem quem ela
ELE Quem
ELA Ele
ELE Ele quem?
ELA Quem ele
ELE Quem ele quem
ELA Ele quem quem
ELE Eu falo sério
ELA Quem quem ele
ELE Quando
ELA No destempo
ELE Onde.
ELA Juan Arriveños, 341
ELE Quem
ELA Almoçando com o que sorri à direita
ELE À direita de quem
ELA Mais para trás Peter
ELE Como?
ELA Loiro com alguns cabelos brancos, é difícil distinguir os brancos dos loiros
ELE Quem
ELA Peter e Juan
ELE Onde?
ELA Se conheceram num churrasco de uma menina de sobrenome Ocampo
ELE Quem como?
ELA Boa gente, um tanto tímida, que se formou no Colégio Northlands de Olivos, de onde surgiu Lea Fate, jogadora de hóquei do Sury
ELE Lea quê?
ELA O irmão Paul Fate jogava rúgbi em Quilmes. A relação entre Ocampo Peter e Juan não deixa de ser um mistério.
ELE Aqui há mistérios
ELA Ocampo tinha relação com Peter e Juan. Juan tinha relações com Ocampo. Peter tinha relação só com Juan. Portanto Ocampo levava vantagem de conhecer os corpos de Peter e de Juan. Juan conhecia o de Ocampo
ELE Mais devagar
ELA Peter conhecia o de Juan e o de Ocampo. Juan se apaixonou por Peter e Peter por Ocampo. Logo depois de separaram porque os três sofreram muito
ELE Não acredito. Quem?
ELA Ela
ELE Ela quem
ELA Quem ela
ELE Quem ela quem
ELA Ela quem quem
ELE Eu falo sério
ELA Quem quem ela
ELE Quem
ELA Ele quem?
ELE Quem ele
ELA Quem ele quem
ELE Quem quem
Eu falo sério
ELA (gritando) Quem quem ele
ELE De onde era?
ELA Quem
ELE Peter
ELA Da Irlanda do Norte
ELE Não acredito

comecemos outra vez

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

"Silêncio do torturado, loquacidade do torturador"

A inominável Flávia Naves nos mandou o seguinte:

"O texto abaixo é a sinopse de uma conferência que será proferida por Marcelo Coelho no ciclo de palestras Mutações, o silêncio e a prosa do mundo, e acontecerá em São Paulo e no Rio a partir do dia 14 desse mês. 

Deixo aqui a prévia de Marcelo e o link do site. beijos

Silêncio do torturado, loquacidade do torturador

Por muito tempo, nas democracias ocidentais, o recurso à tortura como método investigativo esteve na ordem do inadmissível – nos dois sentidos do termo. Em primeiro lugar, tratava-se de algo que ninguém podia admitir como legítimo; séculos de aceitação formal da doutrina dos direitos humanos, inscrita na maioria das constituições e dos tratados internacionais, colocavam a tortura em contradição com os princípios éticos e políticos mais caros à sociedade moderna. Ainda assim, a tortura foi e continua sendo empregada, secretamente, em muitos países democráticos e que se pautam, formalmente, pela defesa dos direitos humanos: órgãos de segurança oficial, autoridades militares e civis persistem, de todo modo, em não reconhecer que isso aconteça. É neste aspecto que o segundo sentido do termo “inadmissível” se acrescenta, ou se acrescentava, às ideias mais frequentes sobre o uso da violência para a obtenção de informações. Mesmo nos regimes ditatoriais latino-americanos, a atitude corrente das autoridades políticas foi a de negar a existência de tortura; não a de admiti-la como um “mal necessário” na luta contra a subversão. A partir dos atentados de 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos, a aceitação da tortura como um “mal necessário” no combate ao terrorismo ganhou os meios de comunicação. Não apenas a partir dos eufemismos governamentais em torno do que seriam apenas “técnicas duras ou especiais de interrogatório”, mas também a partir de elaborações teóricas de juristas e comentaristas políticos, como Alan Dershowitz, Michael Waltzer e Richard Posner. Com algumas diferenças quanto à sistemática legal para implementar o uso da tortura, esses teóricos defendem-na com o que ficou conhecido sob o nome de “ticking bomb argument”. Em suas diversas variantes, o raciocínio descreve uma situação em que cumpre às autoridades extrair de um suspeito, no mais curto prazo de tempo possível, informações capazes de desativar uma ameaça que pesa sobre muitas vidas inocentes. Em termos típicos, imagine-se um ônibus escolar com dezenas de crianças, no qual uma bomba está prestes a explodir, enquanto a polícia detém sob sua custódia um terrorista capaz de indicar o código que abortaria a explosão. Utilizando-se de um exemplo análogo, Alan Dershowitz sustenta que, todas as vezes em que perguntou ao público de suas palestras o que deveria ser feito num caso assim, a esmagadora maioria dos presentes apoiou a tese segundo a qual seria legítimo torturar o suspeito. O irrealismo e a desonestidade desse tipo de argumento foram denunciados em minúcia por autores como Bob Brecher e Michel Terestchenko. Tal é o poder retórico e emocional dessas justificações da tortura, que talvez não seja suficiente, numa palestra para o ciclo “O silêncio e a prosa do mundo”, demonstrar mais uma vez as diversas falhas desse gênero de argumentação –que remonta a uma hipótese clássica de Jeremy Bentham. Caberia desenvolver, ademais da crítica pontual e prática ao uso da tortura, uma análise dos motivos pelos quais essa argumentação repentinamente deixa de ser “impronunciável” e “obscena”, passando a constar do repertório jurídico e filosófico dos que ainda se gabam de pertencer ao círculo do debate civilizado. A atitude de que “o silêncio é de ouro”, do “golden silence”, foi defendida por exemplo pelas autoridades americanas diante das crescentes denúncias de tortura no regime militar brasileiro. O “silêncio” se deixou substituir, entretanto, pela admissão explícita da tortura como um mal menor. De certo modo, reproduz-se nesse movimento, do silêncio para a fala, do silêncio para a confissão, a própria lógica abstrata da relação entre torturado e torturador. Em outra dimensão, também essa lógica se reproduz. Quando o defensor da tortura pergunta a seu público “sim ou não?”, depois de confrontá-lo com um argumento do gênero “bomba-relógio”, parece também querer extrair de seus ouvintes uma confissão, a admissão de uma vilania. Estaríamos diante dessa compulsão à loquacidade — dessa incapacidade contemporânea de aceitar o silêncio — que é um dos temas centrais deste ciclo de debates? Em que medida o silêncio — como ato de resistência, de integridade, e de recusa aos dilemas propostos por um mundo mergulhado no “prosaico” até a medula — seria a resposta mais adequada, e a mais difícil de manter, face à máquina de propaganda e ideologia posta em funcionamento após o 11 de Setembro? E em que medida, por outro lado, a necessidade de falar, de dar resposta, de apresentar alguma solução, tornou-se urgente quando, diante da abominação terrorista, a sociedade americana se viu atônita e perplexa? O terror seria, ao mesmo tempo, uma forma de se “fazer ouvir”, mas que desiste, ou desespera, de qualquer discurso. Que se faça, portanto, o terrorista falar. Mas só o que nos interessa ouvir.
 

segunda-feira, 29 de julho de 2013

:: SATURAÇÃO :: ESGOTAMENTO :: EXAUSTÃO ::

As "performances mentais" de Bruce Nauman. Os escritos de Nauman para "performances mentais", por assim dizer, elaborados entre no fim da década de 1960 e meados da década de 1970, confirmam a importância para o artista da ideia de controle, sobretudo a de autocontrole. As "performances mentais" se assemelham a diretivas para ações e, embora funcionem mais propriamente como proposições a serem imaginadas, não pretendem experiências de descompressão, conforme se poderia supor à primeira vista. Em vez disso, demandam exercícios disciplinadores, restritivos e que, por isso, soam tal qual testes de contenção e de autodomínio. Veja-se, por exemplo, French Piece [Peça francesa (1968)], um conjunto de pequenos textos nos quais são prescritos métodos para transformar o corpo em cilindro ou em esfera, como se de cada fibra muscular fosse exigida muita concentração para se alcançar um objeto geométrico o mais perfeito possível. Corpo como uma Esfera. Enrole seu corpo junto ao canto de um quarto. Imagine um ponto no centro de seu corpo enrolado e concentre-se em contrair seu corpo ainda mais em torno desse ponto. Em seguida, tente pressionar esse ponto na direção do canto do quarto. Fique claro que não se pressupõem essas posições como fixas, a serem praticadas por uma hora todos os dias; elas são, na verdade, atividades ou processos físicos e mentais a serem desempenhados. No início, quem os desempenhe precisará repetir o exercício algumas vezes de modo a preencher a hora, mas ao fim de cerca de dez dias, ele ou ela será capaz de estender sua execução a uma hora inteira. O número de dias necessários para uma performance ininterrupta de uma hora depende naturalmente da receptividade e da preparação de quem a executará23. O tipo de engajamento mental requerido é evidente em Body Pressure [Pressão corporal (1974)]24, trabalho no qual são prescritas maneiras de pressionar com veemência o corpo contra uma parede ("pressione a maior parte possível da superfície frontal de seu corpo contra a parede [...] pressione arduamente e concentre") e anunciados comandos que implicam exercícios de imaginação ("forme uma imagem de si mesmo [...] no lado oposto da parede, pressionando arduamente contra a parede") que culminam na remoção mental da referida parede ("comece a ignorar ou bloquear a espessura da parede, remova a parede"). Logo depois, há a convocação de um aspecto mais sensório da proposta: "pense como várias partes de seu corpo pressionam a parede, que partes a tocam e que partes não a tocam [...] concentre-se na tensão dos músculos, na dor onde os ossos se encontram, nas deformações das carnes que ocorrem sob pressão, considere os pelos do corpo, suores, odores". E, por fim, o texto se encerra com a seguinte sugestão: "isto pode se tornar um exercício muito erótico". Diga-se que há, evidentemente, algo desse erotismo no caminhar moroso em que Nauman atrita os quadris no corredor. Em meio à experiência reguladora que se dá entre o corpo e as paredes, o corpo é constrangido a atinar com os limites ao mesmo tempo em que os demarca e confronta. Encerrado em espaços forjados para si, o corpo comporta-se de modo ambíguo, tal como se encontrasse abrigo e repouso contra as superfícies que o envolvem tanto quanto o refreiam e obstruem; superfícies que se definem na negação mesma do movimento. Parece que o corpo termina por se adaptar aos espaços de "clausura", como se fossem feitos para tal submissão: "da claustrofobia à claustrofilia". O link aqui: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1678-53202011000200011&script=sci_arttext

Tecnicas de interrogatório e tortura

Tipos de tortura: -FÍSICA: através do sofrimento físico, com a utilização de pau-de-arara, borracha, afogamentos, choques elétricos, bofetadas, etc. -PSICOLÓGICA: por meio de ameaças, humilhações, vexames, injúrias, tratamento degradante. -QUÍMICA: por mistura de drogas na comida ou na água, cheirada, injetada; e soro da verdade, gases tóxicos, etc. -SEXUAL: por castração, estupro, ato libidinoso, etc. Tipos de torturadores: -SÁDICOS: são os que fazem porque gostam de fazer. -CUMPRIDORES DE ORDEM: fazem como se estivessem cumprindo uma obrigação; atendendo determinação de uma autoridade. -PATOLÓGICOS: portadores de anomalias mentais, destacando-se, por exemplo, os paranóicos. Detalhes aqui, ó: http://jus.com.br/artigos/8797/tecnicas-de-interrogatorio-e-tortura

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Comissão Nacional da Verdade

A Comissão Nacional da Verdade foi criada pela Lei 12528/2011 e instituída em 16 de maio de 2012. A CNV tem por finalidade apurar graves violações de Direitos Humanos ocorridas entre 18 de setembro de 1946 e 5 de outubro de 1988. Conheça abaixo a lei que criou a Comissão da Verdade e outros documentos-base sobre o colegiado.

Os trabalhos da Comissão Nacional da Verdade estão divididos em três grandes subcomissões: Pesquisa (dividida em grupos de trabalho temáticos), Relações com a Sociedade e Comunicação. Verifique quem é responsável por cada área:

a. Subcomissão de "Pesquisa, geração e sistematização de informações". Subdivisão em grupos temáticos (atualizada em dezembro de 2012):

Grupo de Trabalho: Golpe de 1964
Grupo de Trabalho: Estrutura de repressão
Grupo de Trabalho: Graves violações de Direitos Humanos (torturados, mortos e desaparecidos)
Grupo de Trabalho: Violações no campo
Grupo de Trabalho: Violações de direitos de indígenas
Grupo de Trabalho: Araguaia
Grupo de Trabalho: Operação Condor
Grupo de Trabalho: Violações contra estrangeiros e violações fora do Brasil
Grupo de Trabalho: Ditadura e Sistema de Justiça
Grupo de Trabalho: Papel das igrejas durante a Ditadura
Grupo de Trabalho: Perseguição a militares
Grupo de Trabalho: O Estado Ditatorial-Militar
Grupo de Trabalho: Ditadura e gênero
* Outros grupos temáticos podem ser criados para atender a estrutura do relatório

A seguir, trechos da matéria:

"A minha fala é para quem não está mais aqui e para os parentes e amigos que sofreram. Contar essa história é muito difícil e doloroso", disse Ana Maria, ao lembrar os momentos que ficou afastada da filha, Ramona, que tinha menos de um ano quando de sua prisão, em 1975.

Na ocasião, Ana foi forçada também a interromper a carreira de pianista. "Cheguei para a aula de piano e o professor me mostrou um jornal, com uma matéria que falava sobre a minha detenção. Ele me disse que eu não poderia mais continuar o curso. E estava ficando mesmo perigoso. A minha carreira dependia do público e o cerco se fechava cada vez mais. Na prisão, quando descobriram que eu era pianista, os torturadores batiam nas minhas mãos", lembrou ela.

A seguir, texto completo:

A Comissão Nacional da Verdade foi criada pela lei 12528/2011 e instituída em 16 de maio de 2012. Nos sete primeiros meses de funcionamento, a Comissão dedicou-se a definir os marcos legais do seu trabalho, a organizar a pesquisa das graves violações de direitos humanos ocorridas no período de 1946-1988, a definir e ampliar sua equipe de trabalho, a estabelecer comunicação constante com a sociedade e parcerias com órgãos governamentais e com a sociedade civil organizada.

Em julho de 2012, a CNV recebeu em Brasília diversas organizações da sociedade civil para receber sugestões sobre o trabalho, informações e documentos. Várias das intervenções do público foram aceitas pela Comissão que manteve durante todo o ano contato direto com o público, seja, ao vivo, percorrendo o país de norte a sul em 15 audiências públicas e em outros eventos públicos dos quais participou, seja pelo uso das redes sociais (Twitter,Facebook e Youtube) na sua comunicação, ou ainda por meio de parcerias firmadas com comissões congêneres e outras organizações.

Um exemplo de parceria é este site em que você navega agora. Ele é fruto do trabalho conjunto entre a Comissão da Verdade e o Ministério da Educação.

Em setembro, a CNV definiu seu principal marco legal: por meio da resolução nº 2, estabeleceu, definitivamente, que as graves violações de Direitos Humanos examinadas pela comissão são aquelas praticadas por agentes públicos. Um dos pilares para a decisão é a lei 9140/95, uma das que estabelecem as bases para o surgimento da Comissão Nacional da Verdade.

Também em setembro, após recomendação da CNV, atendendo solicitação da família Herzog, a Justiça de São Paulo determinou a mudança do registro de óbito de Vladimir Herzog para que a causa da morte do jornalista, em 1975, fosse alterada de asfixia mecânica para morte em decorrência "de lesões e maus-tratos sofridos em dependência do II Exército – SP (Doi-Codi)".

Segundo a decisão, transitada em julgado em dezembro, a CNV "conta com respaldo legal para exercer diversos poderes administrativos e praticar atos compatíveis com suas atribuições legais, dentre as quais recomendações de 'adoção de medidas destinadas à efetiva reconciliação nacional, promovendo a reconstrução da história', à luz do julgado na Ação Declaratória, que passou pelo crivo da Segunda Instância, com o reconhecimento da não comprovação do imputado suicídio, fato alegado com base em laudo pericial que se revelou incorreto, impõe-se a ordenação da retificação pretendida no assento de óbito de Vladimir Herzog". A sentença abriu caminho para que várias famílias reivindiquem o mesmo direito.

Em dezembro, a CNV anunciou a divisão de sua pesquisa em 13 grupos de trabalho temáticos, que estão se debruçando sobre os mais diversos temas relacionados à repressão sistematicamente praticada pelo Estado ditatorial-militar, como a Guerrilha do Araguaia, a participação brasileira na Operação Condor, o papel das Igrejas e da Justiça nesse período de nossa História, etc.

Ao longo do ano, a CNV obteve recursos físicos, financeiros e de pessoal para executar sua missão. Partindo de um staff com sete membros e 14 assessores, hoje a CNV conta com uma equipe de 50 pessoas, entre membros e colaboradores, para alcançar seu objetivo: entregar à sociedade brasileira, em maio de 2014, um relatório circunstanciado sobre as graves violações de direitos humanos ocorridas no Brasil entre 1946 e 1988, contendo recomendações ao Estado brasileiro para que este nefasto período de nossa história não mais se repita.

Em janeiro de 2013, a Comissão Nacional da Verdade ganhou um reforço de peso, por meio da assinatura do acordo de cooperação técnica com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) , que visa prestar suporte à estruturação da Comissão nos três principais eixos de trabalho da CNV: pesquisa, articulação com a sociedade e comunicação.

Em 21 de maio de 2013, pouco após completar um ano, a Comissão Nacional da Verdade apresentou um balanço de suas atividades ao país. Este é o documento mais atualizado sobre o que a CNV produziu em seus 12 primeiros meses. Acesse o conteúdo do balanço. No mesmo dia foi apresentado resultado parcial das pesquisas conduzidas pela professora da UFMG, Heloísa Starling, assessora da CNV. Veja, no youtube da TV NBR, vídeo com a transmissão integral do evento realizada pela TV do governo federal.

No site da Comissão Nacional da Verdade há inúmeros documentos com todo o estudo e pesquisa explicitado. Foi de lá que eu tirei esses recortes. Segue o link: http://www.cnv.gov.br/

quarta-feira, 17 de julho de 2013

reencontro #3

quarta-feira, 17 de julho de 2013
sede inominável - 13h/16h
adassa martins, andrêas gatto, bruno marcos, diogo liberano, flávia naves e natássia vello

engraçado. acabo de perceber que escrevo reencontro, quando, na verdade, se trata de encontro. nessas configurações, nunca estivemos. gente nova, desperta. sei lá. não é um problema. é só uma percepção solta.

hoje foi também especial. focamos em apenas uma leitura do texto, apenas do personagem masculino, ele, lido pelo andrêas. porém, antes da leitura, eu, bruno, natássia e também andrêas nos fizemos perguntas para que fossem especuladas durante a leitura. ao término, respondemos a partir do olhar que cada um pode lançar à leitura do personagem.

descobrimos algumas coisas: ela é o primeiro caso de tortura dele. ele nunca havia torturado alguém antes. descobrimos também o que nela causa nele algum tipo de fragilidade: o olho no olho, os assobios e as evasões, o não dar nome. curioso detectar um teor líquido nela, capaz de fugir, difícil de ser pego. também, por conta das perguntas feitas, chegamos aquilo que ele não pisaria. (pisar em todos os sentidos). ele não piso no espaço, mas talvez pisasse no tempo (para cessar o avançar das horas).

quanto mais o tempo passa mais a morte dela se confirma. por isso, talvez, ele não queira ver o tempo passar. ele se ultrapassa, projeta antes ou no depois, mas não neste agora. não neste agora.

amanhã faremos o mesmo exercício, porém, lendo apenas o texto dela. e faremos novas perguntas para desvendar o impossível.
 

terça-feira, 16 de julho de 2013

reencontro #2

terça-feira, 16 de julho de 2013
sede inominável - 13h/16h
adassa martins, andrêas gatto, bruno marcos, diogo liberano e natássia vello

engraçado. neste segundo encontro não fizemos leitura da peça, no entanto, por conta do papo, das coisas ditas, voltamos inúmeras vezes ao texto. movidos por lembranças de falas, esquecimentos de trechos, linhas decoradas e explodidas no ímpeto de dizer o que se pretendia dizer.

hoje foi especial porque sem afobação, eu fui dizendo o que tinha sido o processo para chegar a alguma compreensão do texto. como disse aos meninos, demandou muito tempo de leitura, de pesquisa (tudo registrado nesse blog). e assim, confesso, percebi que o que já temos de compreensão não muda. apenas serve para aprofundarmos ainda mais a nossa ousadia deste agora. ir mais fundo, mais longe, ser mais categoricamente claro na proposta, na escrita.

bruno falou da diferença entre cristalizar e clarificar. é isso, bruno. clarear, deixar claro, transparente, possível a uma arena. possível de ser visto por todos os lados. eu falei do desenho do cenário - que eu assino/assinarei. falei da área quadrangular; medimos algo entre 4m² e 3m². algo entre isso (digo, largura e comprimento). uma área de no mínimo 9m² e de no máximo 16m².

falei do blindex. do chão de vidro. sobre o qual resta a estortura. falamos do filme o último tango em paris, que foi o que me fez sentar e começar a escrever sobre não dois, em dezembro de 2008, quando nasceu - ainda sem saber - o teatro inominável. falamos sobre o realismo capitalista. sobre o artigo do thomas ostermeier (leia aqui) que, ao falar de um teatro contemporâneo (como em muitos casos é o nosso, carioca), diz:

A poetologia desse teatro baseia-se na ideia de que a ação dramática não é mais de nossa época; que o homem não poderia se compreender como mestre de suas ações; que existem tantas verdades subjetivas quanto o número de espectadores presentes; que os acontecimentos representados no palco não exprimem nenhuma verdade válida para todos; que nossa experiência fragmentada do mundo somente encontra sua tradução num teatro fracionado, em que os gêneros se justaponham: corpo, dança, fotos, vídeos, música, palavra... Essa imbricação sensorial assegura ao espectador que este mundo caótico permanecerá para sempre indecifrável e que não há espaço para procurar ligações de causalidade ou culpados.

essa citação chama atenção para um desejo inédito: encontrar culpados. levantar dedos. apontar. acusar. não mais ser imparcial. saber ser parcial, com provas, com sentido e lógica, com opinião, oferecer ao espectador um olhar (para que, mesmo discordando, ele também possa pensar/ser a sua opinião sobre o mundo).

sobretudo, me parece importante frisar a noção de sobrevivência (leiam esta postagem, de 24 de outubro de 2009). sobre como ele, ao perdê-la, se perde. e sobre como ela, ao se deixar morrer, também se perde para sempre. do esforço de sobreviver, de durar.

é, mais uma vez, mandar ver no presente agora. que prazer é estar imerso em criação (de outro mundo).
  

segunda-feira, 15 de julho de 2013

reencontro #1

segunda-feira, 15 de julho de 2013
sede inominável - 13h/16h
adassa martins, andrêas gatto, bel flaksman, bruno marcos, diogo liberano, flávia naves, natássia vello e thaís grechi

primeiro reencontro (mesmo contando com tantas novas presenças). hoje começamos o nosso re-processo de não dois, a partir da obra paso de dos de eduardo pavlovsky. a verdade é que não é a partir. é a obra em si, porém, não abrimos mão do nosso título. ele traz a pegada, a nossa visão sobre o texto do dramaturgo argentino.

após uma única leitura do texto (eu ouvi a leitura em português, traduzida por maria angélica keller de almeida, e fui acompanhando a versão original, em espanhol). passa rápido, mas fica. 31 minutos de leitura, mas tanta coisa incompreendida. esse texto, ainda hoje, consegue manter tantas indagações, tantas feridas abertas.

chegamos ao assunto do momento: ditadura argentina? ditadura brasileira? comissão da verdade? manifestações que estão acontecendo nesse brasil de 2013? nesse mundo de agora?

onde ecoar o drama escrito? se antes o nosso foco tinha sido a relação de horror e afeto entre dois seres humanos, um homem e uma mulher, agora, porém, nos parece difícil não acessar o viés da história. poderíamos omitir, mais uma vez - como na montagem original, por escolha do estômago - poderíamos escolher ficar no afetivo, no passional, no um a um, homem versus mulher. mas não. não. homem e mulher são homem e mulher em sociedade. é preciso entorno.

por isso, capturar o drama fora dele. na cidade, no país, no passado, no tempo, lá longe, lá fora... assim, procedimentos novos se anunciam.

após muita conversa/discussão, chegamos a um ponto: trata-se do artifício. somente a arte pode nos possibilitar essa investida na vida para além dela própria. brincar de morte, poetizar para desdobrar a nossa percepção/ação de mundo. será artificioso, para que se devolva a vida a ela própria.

parece ousadia. e talvez seja. tudo bem.

é seguir. mais uma vez (e dizer/escrever isso nunca fez tanto sentido).

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