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terça-feira, 16 de novembro de 2010

# 40

19 de setembro de 2010 – Teatro Glaucio Gill – 15h/17h
dan marins, diogo liberano e natássia vello.

último ensaio, um dia antes do festival. no ensaio anterior focamos o início do espetáculo até o segundo movimento. neste, estudamos a partir do terceiro até o fim.

escrevi alguns trechos de texto:

eu pensei
pensava que talvez
me lembro
esperava algum gesto
você não respondeu
nem pegou o cigarro

não sei o que significam, mas acho que estive pontuando ao dan como seu personagem está buscando, como não sabe, como está tentando chegar a algum lugar... acertamos algumas marcas, o quarto movimento ganhou em energia e intensidade. cada vez mais briga de casal. escrevo a expressão intensidade da sinceridade...

o que é isso? ainda não sabemos totalmente... nos vem em vislumbres, e é de difícil apreensão... depois fizemos um passadão, um geral para o festival, o segundo movimento da natássia foi bem mais interessante (mas hoje, novembro, ela já voltou à segurança do que fazia... precisamos sempre redescobrir o que é se afetar).

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

# 39

18 de setembro de 2010 – Teatro Glaucio Gill – 13h/16h
dan marins, diogo liberano e natássia vello.

fizemos um bom ensaio (lembro hoje ao escrever em novembro o relatório desse ensaio no penúltimo dia da temporada de MIRANDA no glaucio gill). foram dois ensaios para o festival ENCONTRARTE, para o qual NÃO DOIS fora selecionado.

a natássia estava completamente receptiva e investigando os porquês de sua personagem. especulamos e testamos bastante as viradas, as revelações, o como ela sai de dentro de si mesma. o como se permite morrer. continuamos ainda hoje desbravando esse eterno mistério, mas foi um ensaio onde conseguimos enrijecer, estremecer por conta da experiência textual/cênica.

foi o primeiro ensaio que ensaiamos sem paredes concretas. fiz uma marcação com fita adesiva no chão, fechando um quadrado quase perfeito dentro do qual a área cênica era situada. suprimimos as encostadas de dan contra as paredes e focamos o ensaio também na projeção vocal (estávamos ensaiando justamente no palco do glaucio gill, uma vez que nossa apresentação no festival seria feita num palcão...). 

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Últimas apresentações do ano,

O Teatro Inominável apresenta hoje (sexta) e neste sábado as duas últimas apresentações de NÃO DOIS neste ano, aqui no Rio de Janeiro. Para quem não assistiu, não deixe de comparecer. Ainda estamos na RAMPA - Lugar de Criação, um espaço incrível - mesmo - que fica na Rua Sá Ferreira, 202, em Copacabana. Basta pegar o metrô e saltar na estação General Osório.

Estortura \\ Por Alexandra Arakawa

O espetáculo, que está só começando (e que a cada apresentação se desvenda um pouco mais), completa uma trajetória de apenas quinze apresentações, entre temporadas e festival. E de lá até aqui, ganhos imensos a cada espaço novo encontrado e, sobretudo, a cada espectador encontrado.

Nestas últimas apresentações, faremos ligeiros debates ao término do espetáculo. Esperamos por vocês,

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

# 38

04 de junho de 2010 – Sala Paraíso (Teatro Carlos Gomes)
dan marins, diogo liberano e natássia vello.

nosso ensaio geral, cujo relatório escrevo hoje, meses depois, a partir de anotações feitas em meu caderno.

não há nada escrito que signifique algo realmente. há apenas MESA, CABO PARA LIGAR, 10M DE FIO, MACHO/FÊMEA, JET/JORNAL, FITA ROSCO PRETA, MAQUIAGEM... e Você não acha? Voltar a argumentar Primeiro falamos de palavras...

a estreia foi no dia seguinte, 05 de junho de 2010. apresentaríamos a nossa quarta apresentação.

# 37

02 de junho de 2010 – UFRJ – 22h/00h
dan marins, diogo liberano e natássia vello.

semana de estreia, também escrevo esse relatório meses depois. que engraçado isso. não quero que seja sempre assim.

neste ensaio acho que ficamos mexendo com pausas. as micro pausas que mudam tudo. que me fazem clarear algum entendimento. esse texto pede isso, pede essa calma, não se pode falar de violência unicamente via velocidade e grito. ah, pavlovsky, ah...

acho que montamos o espetáculo sem se perder muito no entendimento como sendo algo explícito. mas hoje isso me falta. a partitura já dominada, tudo já bem incorporado, exceto a fala. o texto. tenho por vezes que os atores ou não compreendem ou compreendem, mas não conseguem externar. que difícil deve ser.

o que terá crescido tanto entre nós dois? alguma coisa que não entendo... alguma coisa que me faz sentir ambíguo e que me produz terror ter sentido piedade em algum momento... não posso ser piedoso comigo mesmo, nem com os atores, nem com nosso trabalho...

reflexões que escreve hoje, meses depois, mas que me fazem ver como desde lá atrás as coisas já vinham nesse sentido. e penso, devo mandar um e-mail solicitando aos meninos que entrem e leiam isso tudo. mais: marcar um ensaio com texto. para as duas últimas apresentações de nossa mini-temporada na rampa (novembro de 2010)...

# 36

31 de maio de 2010 – UFRJ – 22h/00h
dan marins, diogo liberano e natássia vello.

O relatório deste ensaio está sendo escrito meses depois do ocorrido. Mas tenho as anotações feitas à mão e ao lê-las, as coisas meio que surgem novamente. É engraçado, lendo isso aqui agora, a sensação é de estar faz tempo andando em círculos. Vejamos:

Exercícios vocais; o tempo do prólogo me pareeu equivocado (engraçado como as falas tentemos outra vez se encaixa com a partitura. isso foi proposital? não me lembro...). pedi ao dan economia da tosse. eu quase quero acreditar que ele se engasgou. quase.

1º Movimento \\ Dan muito devagar, com as mãos para trás (não ao gesto cotidiano; optamos pelo estilizado, pelo estranhamento); tempo do enforcamento errado; sugiro uma fala mais incisiva para a Natássia (ainda hoje não sabemos que personagem é esse);

2º Movimento \\ Erro do Dan me abre espaço para o erro na cena (contamino-me por conta do espetáculo VAZIO É O QUE NÃO FALTA, MIRANDA - minha cabeça dá nós sucessivos); pontuei como era boa mão da Natássia que ficava no ar e abrir quando Dan virava contra a parede (hoje já encontramos outra coisa); neste ensaio Dan cisma em colocar as mãos atrás da cintura; texto do pai muito veloz (foi um ensaio em que tudo estava me incomodando);

3º Movimento \\ Escrevo no caderno "Vocês precisam estudar!" e defender a partitura, torná-la legível. A mesma conversa do ensaio anterior: responsabilizar-se; percebo imprecisão na partitura; é quase uma tortura e não quero ser também um torturador;

4º Movimento \\ Encaixe impreciso das partituras; Dan fala possessivo e empurra Natássia com força ao chão, escrevo Que porra é essa?! Tudo, menos essa literalidade. Tudo menos isso. As falas do quatro movimento querem significar pelos movimentos: é terrível. Escrevo não estamos improvisando...

Todo o resto do ensaio foi nesse esquema. A sensação de que os atores se acostumam e começam a tornar a coisa normal, banal, cotidiana... Não sei... Veremos o próximo ensaio, sinto-me chato.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Tatames com lona de algodão


O espaço acima foi o recorte escolhido por nós no último ensaio. Vamos trazer para a cena a parede acima, com suas passagens de ar, sua textura e sua cor. Vamos manter nosso formato original, o italiano. O chão treme, o chão grita. A cada passo os atores falam mais do que a boca pode dizer. O piso de algodão responde a cada passo. É impossível não perceber. Como se faz? Se faz como sempre foi feito. O som vira arquitetura capaz de compor. O som do chão sendo mexido vira a metáfora da violência.

O tatame está montado para receber uma história de amor. Curioso, não? Mais duro ainda que a madeira, mais frio que o piso frio e azulejado, é o algodão. Macio, claro e capaz de queimar.

_______
Sinopse
NÃO DOIS da obra Paso de Dos de Eduardo Pavlovsky. Drama. Um caso de violência na relação homem/mulher. A vítima é destruída, mas o torturador não consegue se apoderar de sua palavra. Resta a questão: quem cala consente? Com Dan Marins e Natássia Vello. Dir. Diogo Liberano. (35min). Classificação Indicativa: 14 anos.

5, 6, 12 e 13 de novembro, às 20h, na Rampa, Lugar de Criação
espetáculo seguido de debate \ ingresso a 15,00 (inteira)

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

NÃO DOIS na Rampa, Lugar de Criação

O Teatro Inominável fará quatro apresentações de NÃO DOIS no mês de novembro. Serão duas sextas e dois sábados, com apresentações às 20h seguidas de debate, na Rampa, Lugar de Criação. Um espaço incrível em Copacabana e que, sem dúvida alguma, nos trará inúmeras revelações sobre o espetáculo.

Rampa, Lugar de Criação \\ R. Sá Ferreira, 202 - Copacabana

Outro espaço, variações cênicas para jogar com o novo. Apresentaremos no terceiro andar da Rampa, num espaço chamado Dojo. O chão é coberto por tatames com lona de algodão que transformam o chão num espaço em branco, aumentando ainda mais a sensação de assepsia que marca o trabalho. Não há mais paredes, serão (quem sabe) paredes feitas pelos espectadores que nos assistem. Não deixem de prestigiar, serão apenas quatro apresentações.

NÃO DOIS \ 5, 6, 12 e 13 de nov, sex e sáb, 20h \\ PEÇA + DEBATE


Nas duas semanas , NÃO DOIS se apresenta e é seguido pela apresentação de outro espetáculo. Trata-se de BALÕES, dirigido por Caio Riscado a partir de outra obra (Vermelhos Balões Vemelhos) de Eduardo Pavlovsky - o mesmo dramaturgo de Paso de Dos. Portanto, quem quiser conhecer ainda mais a dramaturgia de Pavlovsky, vale assistir aos dois espetáculo. NÃO DOIS às 20h e BALÕES às 21h. 

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Sobre o processo de montagem de NÃO DOIS

Começou como conclusão de uma disciplina curricular do curso de Artes Cênicas: Direção Teatral da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ – no qual sou aluno. Cumpriu suas únicas três apresentações em dezembro de 2009 e realizou uma temporada em junho, na Sala Paraíso do Teatro Municipal Carlos Gomes, no Rio de Janeiro.

Partimos do texto PASO DE DOS do excelente dramaturgo argentino Eduardo Pavlovsky. O nome do espetáculo acabou se tornando NÃO DOIS, que por sua vez, surgiu de uma tradução do título em francês da peça, PAS-DE-DEUX. O “pas” em francês é uma partícula de negação e a encenação que construímos parte de um esforço para quebrar a dicotomia que se instaura sob variadas formas e nos impede de ver a complexidade da vida, de entrar em contato com ela.

Assim, esta encenação apresenta uma relação entre um homem – ELE – e uma mulher – ELA. Uma relação que chegou ao fim. Parte da vontade de investigar a possibilidade do horror e do afeto num mesmo gesto. Tem a ver com pontos de vista. Não desejamos dizer o que é e o que não é, mas sugerir, atentar para o fato de sermos sujeitos às interpretações. Atentar para o fato de que não detemos em nós sentido algum.

Encontramos no ditado popular QUEM CALA CONSENTE o mote de partida. O texto apresentava uma situação de violência entre um homem e uma mulher, entre aqueles que seriam, respectivamente, um torturador e uma torturada. Na dramaturgia, o homem exige da mulher o seu reconhecimento e ela cala. Ela tem o corpo por ele destruído, mas cala, não lhe dá seu reconhecimento. Em outras palavras, ela – apesar de calar – não consente o que lhe é exigido. Esse texto, portanto, me fez pensar na expressão “nem sempre”. E a encenação NÃO DOIS é uma tentativa de inserir dentro do ditado popular esta expressão, como se quiséssemos dizer que quem cala nem sempre consente.

Servimo-nos de improvisações buscando relações distintas entre as duas personagens. Partimos de composições físicas em primeiro plano e, depois, do encontro entre uma partitura e um texto. O processo pôde se desenvolver quando percebemos como o embate entre expressão física e verbal era rico. Como poderíamos dificultar uma leitura mais literal em troca de sugestão, em troca da requisição do público enquanto cúmplice dos fatos postos em cena.

O trabalho de construção das cenas se pautou na feitura de composições. Era solicitado aos atores que executassem uma composição na qual eles deveriam inserir todos os itens que eu havia colocado numa lista. A obrigatoriedade no cumprimento dos itens determina uma cena quase sempre muito distinta, porque exigia aos atores a soma de ingredientes por vezes extremamente dificultosos de serem somados. Eram momentos propícios para a gênese do contraditório, como costumo dizer.

Em cena, optamos por uma partitura que se repete inúmeras vezes pela dupla de atores. Ora estão juntos, ora em separado. Com variações de direção, ritmo, intenção. A partitura é o desenho dessa relação que hoje não existe mais. A partitura como tentativa de evocar pelo movimento a vida já perdida, acabada. O esforço da repetição. A tentativa de lembrar daquilo que não existe mais, mas que, no entanto, preencheu duas vidas.

Por Diogo Liberano

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Hoje tem NÃO DOIS no EncontrArte

Hoje, às 20h, no Espaço Cultural Sylvio Monteiro, em Nova Iguaçu, faremos uma apresentação de NÃO DOIS dentro do festival EncontrArte 2010. Será apenas uma apresentação. Maiores informações, consulte o site do festival: www.encontrarte.com.br.

ENCONTRARTE

Na semana passada, fizemos ensaios nos preparando para esta apresentação. Faremos num espaço muito maior do que o costume e para um público também muito maior. Em breve maiores informações sobre a apresentação no festival.

sábado, 17 de julho de 2010

NÃO DOIS é selecionado para o EncontrArte

NÃO DOIS foi selecionado para o Festival Encontrarte 2010. Será uma apresentação em setembro, a primeira participação do Teatro Inominável e de NÃO DOIS num festival de teatro.

EncontrArte 2010

Maiores informações em breve. Sobre o festival, acesse:
http://www.encontrarte.com.br

sábado, 26 de junho de 2010

Último Final de Semana

Eis que chegamos às últimas apresentações de NÃO DOIS nesta primeira temporada. E como foi interessante. Receber um público outro, se confrontar com a repetição daquele jogo que havíamos feito tão poucas vezes. Na verdade, ainda é pouco, é preciso fazer mais e mais vezes. Porém, nessas apresentações acabamos dilatando a compreensão nossa sobre o material. Eu começo a ter mais clareza do que possa ser… E isso pressupõe ainda mais trabalho.

Sobretudo, nestas apresentações, nos debatemos muito com a questão do ter que fazer sentido. Durante o processo, fomos guiados pelo movimento, simplesmente pela movimentação do corpo sem pressupor sentido. Um corpo movente sem significado. De um braço que ia e voltava, sem falar nada (e falando tudo, ao mesmo tempo). Agora, percebemos como queríamos dotar cada investida física de intencionalidade. E percebemos também, inevitavelmente, como isso não diz nada para o nosso espetáculo.

Acreditar no que não está dito, acreditar no que se pode sugerir, naquilo que se pode evocar. Acreditar no espectador também como autor do espetáculo. Abrir vias para que escreva, por meio dos corpos dos atores, a sua própria leitura do espetáculo. A sua própria leitura de mundo.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Ante…Penúltimo Final de Semana

Já estamos chegando em nosso penúltimo final de semana, em cartaz no Teatro Municipal Carlos Gomes. No entanto, cabe aqui registrar como foi incrível a última apresentação, ocorrida no domingo 13 de junho de 2010. Como um teatro da Prefeitura do Rio, também no Carlos Gomes o segundo domingo do mês integra o programa de teatro a R$ 1,00.

Ao chegar no teatro, uma fila gigantesca dobrava a esquina e seguia sem fim. Sem dúvida, a maioria dos presentes estavam ali para assistir ao espetáculo AVENIDA Q, também no Carlos Gomes, só que tendo esgotado todos os lugares, no final das contas muitos espectadores ficaram de fora. E foi quando aproveitei para divulgar o nosso espetáculo, conseguindo lotar os nossos 30 lugares e nos proporcionando um encontro incrível.

Incrível por vários aspectos. Em primeiro, porque nós desconhecíamos a totalidade daquela platéia. Segundo, tinha a sensação de que eles não tinham ido assistir ao nosso espetáculo, mas acabaram entrando para não perder a viagem. E isso fez toda a diferença, positivamente. A platéia foi tão receptiva, reagindo ao nosso espetáculo de uma forma tão inédita para mim. Não era uma platéia acostumada, eles estavam ali, duelando com o que se movia diante de seus olhos.

montagem do cenário e da luz

Ao término, propûs um pequeno debate, enfim, para ouvir, trocar, responder, questionar, buscar… E foi então que algo muito incrível aconteceu. Eu nunca tinha ouvido tanto sobre o projeto que não tivesse sido dito por pessoas envolvidas nele. Dos que permaneceram no espaço para o debate, muitos falaram e abriram questões e leituras que foram tão determinantes durante o nosso processo.

Foi realmente incrível ouvir palavras que não estão no texto, mas que foram essenciais em nosso processo. Inconsciente, consciente, espírito… As leituras e opiniões divergiam e se encontravam e era esse o jogo, bastava especular.

Deixo aqui o registro de algo muito forte que sem dúvida alguma me devolveu a força do projeto de volta. E me abriu ainda mais questões… Uma senhora disse, não sei ao certo com quais palavras, mas algo como o teatro é uma coisa muito especial, não? Não tenho dúvidas. Talvez mais certo agora, depois de ouví-la dizendo…

NÃO D O I S

domingo, 13 de junho de 2010

a temporada continua…

natássia na paraíso

aos sábados – 19h – e domingos – 17h – na sala paraíso do teatro municipal carlos gomes.

sábado, 5 de junho de 2010

MERDA

é incrível como a arte não se acomoda. tudo já acertado, tudo sabido e, de repente, do nada, algo irrompe do que acomodado estava e sugere o novo, sugere uma outra configuração. eu fico incrível. sério mesmo. como se pode ser tão afetuoso assim? a peça vai nos recebendo e criando nela e por sobre ela mesma mais encontros. mais e mais possibilidades que se ficassem em nós seriam apenas possibilidades. mas nela, convertem-se em encontro. em realização.

eu não sei. estou montando agora esperando godot e vejo em não dois o mesmo que em godot. quero dizer, quem alcança sempre espera. e é bem assim que me sinto. estou esperando o encontro de amanhã, de hoje, desta estreia, para desbravar outros mais e outros lugares e outras intenções e outras tentativas. somos inesgotáveis. e que delícia está sendo viver isso. sem complemento. apenas viver isso. é bom. é duro. faz a gente reclamar. ser chato. inseguro. inseguro. estar instável é estar vivo e aberto ao inesperado.

esta encenação. está se descobrindo. se desautoriza. se afirma e nos coloca contra a parede e diz, foram vocês que me fizeram assim, agora sustentem a dor e a delícia de ser o que sou. ai. quanta coisa para dizer, quanta coisa para calar. quanta coisa que isso evoca. eu não queria deixar de registrar, aqui – neste espaço – como a vida acaba sendo capturada e colocada ali, no meio da sala de ensaio.

o meu trabalho é vital. e isso é o que me move. para o bem e para o mal. para além de um e de outro. através. vamos rumo ao encontro. vamos rumo de encontro. vamos rumo. vamos, apenas.

segunda-feira, 31 de maio de 2010

# 35


29 de maio de 2010 – Sala Paraíso (Teatro Carlos Gomes) – 14h/16h
dan marins, diogo liberano e natássia vello.

fico me perguntando como tornar o ator responsável por aquilo que deve fazer em cena? sabe, chega um dado momento que o diretor não precisa e nem pode mais ficar lembrando que certas coisas precisavam ter sido feitas. é estranho. porque se não fizeram, o que isso pode significar que não seja um mero esquecimento? às vezes as propostas que eu julgo essenciais ainda não encontraram nos atores a sua potência. a minha leitura as valida, mas a experiência de tal ação ou gesto às vezes ainda é vazia. isso é um problema?

dan fez uma linda pausa antes do primeiro movimento. perfeita. mudou tudo. percebi como essa peça tem mesmo algo de fantasmagórico que a marina vianna anunciou ao escrever a sua opinião sobre a peça. ela disse que a peça esbarra no onírico e no quase fantasmagórico. num dado momento do ensaio, percebi que a natássia surgia próxima ao dan como um fantasma mesmo, como uma existência não corpórea, algo que não sei explicar. a nat trouxe uma tensão maior para o interrogatório. já não consigo vê-la apenas debochando d'ELE. há algo ali forçosamente doloroso para ela.

como ficar na sugestão? que medo. a cada ensaio parece que a peça quer fazer um sentido explícito, quando desde sempre, ela funcionava bem sugerindo e abrindo possibilidades, não fechando. ah! difícil! mas vamos seguindo, vamos intuindo o que possa ser melhor.

4 ª PAREDE. não me lembro exatamente quando no processo estudamos e conversamos sobre isso. mas neste espetáculo a tal quarta parede existe. e é necessária. o espectador presencia um acontecimento fechado. ele é mesmo voyeur. sua presença é indiferente (enquanto dramaturgia). e determinante (enquanto reflexão). não rola  quebrar a tal parede. não rola.

os meninos trouxeram uma coisa boa ao término do quarto movimento. dan saculeja o corpo de natássia. ela está morta. e depois não está. aproveitei para começar a remarcar o final da peça. a brincar com a trajetória, a topografia desenhada pelo personagem masculino. o texto final da nat num tempo super esgarçado. e o dan num tempo prestíssimo.

mais tempo de escuridão. contra-luz. natássia ao chão.

acrescentei mais dois erros ao espetáculo: em um dado momento da encenação, tanto o dan quanto a nat terão que selecionar uma fala para errar. ou seja, vão começar a dar um texto e pular uma fala. vão voltar à fala e depois seguir, passando pela fala que havia sido antecipada. quero isso. pedi que ambos perfurassem a encenação cada qual num momento trazendo um erro. erro intencionado.

# 34


28 de maio de 2010 – Sala Paraíso (Teatro Carlos Gomes) – 11h/13h
dan marins, diogo liberano e natássia vello.

passadão. nossa peça é extremamente marcada. cada movimento tem seu tempo, cada ação sua duração específica. mas como encontrar algo novo em meio ao já sabido? como oxigenar as engrenagens? neste ensaio, por não lembrarem de algumas ações ou falas, por estarem assim como os personagens tentando lembrar dos movimentos e das falas, tentando lembrar das intensidade, surgiu aquilo que nomeio agora de GESTO-ERRO. tanto o dan quanto a natássia erraram ao mesmo tempo um gesto e o impediram de acontecer. ao mesmo tempo. logo, não foi um erro. foi uma espécie de movimento interrompido feito em simultâneo pelos dois. pedi aos dois que deixassem isso na peça. aos poucos a lógica do tentar lembrar, do se esforçar para lembrar dos gestos e das intenções, acaba tocando no âmbito da representação.

não apenas ELE  e ELA que tentam se lembrar dos acontecimentos. os atores também o fazem. neste dia, depois de um passadão e alguns ajustes, fizemos uma última passada para as meninas que atuam em GODOT, cujo ensaio aconteceria em seguida. dan disse perguntei o seu nome e você disse alguma coisa como frida kahlo. percebi nesse passadão como corremos o risco de querer dotar de sentido cada movimento que desde o início do processo foi apenas um movimento. é preciso continuar acreditando nessa secura do espetáculo. nessa falta de paixão como disse uma das atrizes de GODOT ao comentar sobre a cena.

teaser#01

sexta-feira, 28 de maio de 2010

um pouquinho mais sobre…

o que dizer sobre este espetáculo?

começou como conclusão de uma disciplina curricular do curso de Artes Cênicas: Direção Teatral da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ – no qual sou aluno. cumpriu suas únicas três apresentações em dezembro de 2009 e agora volta para uma primeira temporada.

parte do texto PASO DE DOS do excelente dramaturgo argentino Eduardo Pavlovsky. o nome do espetáculo acabou se tornando NÃO DOIS, que por sua vez, surgiu de uma tradução do título em frânces da peça, PAS-DE-DEUX. o “pas” em francês é particula de negação. e a encenação que construímos parte de um esforço para quebrar a dicotomia que se instaura sob variadas formas e nos impede de ver a complexidade da vida, de entrar em contato com ela.

assim, esta encenãção apresenta uma relação entre um homem – ELE – e uma mulher – ELA. uma relação que chegou ao fim. parte da vontade de investigar a possibilidade do amor e do horror num mesmo gesto. tem a ver com pontos de vista. não desejamos dizer o que é e o que não é. mas sugerir, atentar para o fato de estarmos todos sujeitos a interpretações. atentar para o fato – sim, duro como pedra – de que não detemos em nós sentido algum.

o significado está no outro. e quando o outro acaba ou quando acabamos com o outro, eis que surge o silêncio. e o vazio. e assim o término das intensidades. da experiência de vida.

em cena, uma partitura que se repete inúmeras vezes pela dupla de atores. ora estão juntos, ora em separado. com variação de direção, ritmo, intenção. a partitura é o desenho dessa relação que hoje não existe mais. a partitura como tentativa de evocar pelo movimento a vida já perdida, acabada. o esforço da repetição.

termino essa postagem com um lindo trecho do espetáculo:

ELA Necessidade de te contar coisas, palavras que crescem quando juntos

apesar de você e de mim

apesar de nossa história sempre tão diferente, tão horrivelmente diferente

só crescem

não por você e por mim

brotam sempre palavras onde só deveria existir o grande Silêncio das gritarias

cresce a lembrança apesar dos dois

que estranho espaço teremos inventado

que às vezes não posso deixar de te falar malgrado minha vontade...

terça-feira, 25 de maio de 2010

Sala Paraíso – Teatro Carlos Gomes

a convite do teatro independente – www.teatroindependente.com.br – nós, do teatro inominável, faremos a nossa primeira temporada de NÃO DOIS na sala paraíso do teatro carlos gomes. um espaço super acolhedor e especial. com uma arquitetura toda diferencial e interessante. nessa primeira temporada, que começa já no primeiro final de semana de junho e vai até o final do mês, cumpriremos oito apresentações ao todo. nos sábados de junho às 19h e aos domingos, às 17h.

seguem algumas fotos do último ensaio – #33 – já na sala paraíso.

epílogo. cenografia do acontecimentoquarto movimento. intensidadeterceiro movimento. torturasegundo movimento. memória primeiro movimento. simulaçãoprólogo. um fio para seguir

# 33

22 de maio de 2010 – Sala Paraíso (Teatro Carlos Gomes) 15h/18h
dan marins, diogo liberano e natássia vello.

primeiro ensaio no espaço onde será nossa primeira temporada. tempo para apropriação, para descobrir como o tamanho da peça ali dentro, a intensidade das vozes, para redimensionar, fazer caber, tornar-se parte daquele lugar.

o ensaio começou com uma passada do espetáculo, que dura cerca de 35 minutos. com alguns acréscimos que acrecentaremos, acredito que a encenação ficará com uns 40 minutos de duração. mas não acrescentaremos nada até estarmos minimamente de volta ao ponto em que havíamos parado.

a passado foi boa, os meninos lembraram de quase tudo, faltando alguns movimentos e às vezes engasgando alguma fala. ficou clara a necessidade de transferir para outros lugares certos momentos da peça. após o passadão, ajustamos algumas coisas no espaço e investimos na busca de intenções e estados que precisam ser ainda mais desbravados.

sobre ELE, pedi ao dan que aumentasse o esforço da memória, do fazer lembrar. sobre ELA, pedi à natássia que investisse num movimento que antes de ser feito para atinger ELE, acaba por atingir ela própria. AFETO. num mesmo gesto.

o final do espetáculo definitivamente não funciona. para o ensaio seguinte, o qual os atores estarão sem mim, prepararei algumas indicações que lhes sirvam de mote para o desenvolvimento de um novo desfecho. que difícil tudo isso. deliciosamente difícil. quero fazer! quero ver!

# 32

08 de maio de 2010 – UNIRIO – 15h/18h
dan marins, diogo liberano e natássia vello.

ensaio importantíssimo para percebermos como muito havia sido esquecido. após este ensaio, foi preciso assistir à filmagem com intuito de relembrar marcas. um esforço desmedido para não mudar tudo aquilo que não acontecia porque apenas não era lembrado.

depois de meses afastado da prática desta peça, ela hoje me parece ser outra coisa que não apenas o que é. mas tenho me privado das mudanças. quero ver primeiro pelo outro e não por mim. olhar viciado. atestar pelo outro alguma leitura sobre este trabalho. já já.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Não - Lugar

O PISCAR ENTRE VIDA ENTRE MORTE

Os braços dele apertam seu pescoço, ela não consegue se soltar, o ar começa a escapar do seu pulmão, percebe sua vida se esvaindo e a única coisa que lhe resta é o milésimo de segundos entre o olho aberto e o olho fechado, entre a vida e a morte. Ainda não está morta, mas não há mais possibilidade de estar viva, ela está em suspensão, uma dádiva ou tormento, na qual vai refazer todos os seus passos até chegar ali, vai refazer sua vida, porém a sua dor. E esse momento de sobrevida ganha uma dimensão outra, não vistas pelos olhos vivos, uma dimensão que só pode ser sentida, percebida ou vivenciada por quem está nesse lugar do entre, entre a vida e a morte. Aqui o segundo vira uma eternidade de segundos, e neles ela vai reviver infinitamente a sua trajetória de morte, tentando recordar os seus passos, em silêncio, pois as palavras confundem e distorcem a realidade, e a única coisa que resta é a lembrança dos movimentos, sublinhado pelo o único som que importa: a música que nascia dos seus próprios corpos. Esse momento ecoa por toda a eternidade, numa busca da verdade, numa busca de entender onde ela perdeu o controle de sua vida, mas como nessa dimensão de sobrevida não há verdade nem mentira, ela padece. Esse milésimo de segundos é o purgatório, onde numa trajetória infinita e circular ela vai reviver a sua morte, até que finalmente seus olhos fechem.

domingo, 25 de abril de 2010

em breve... no Rio de Janeiro.

estamos produzindo a estreia de NÃO DOIS no Rio de Janeiro. fechando pauta, fechando cenário, fechando ensaios, luz, ajustes de figurino, programação visual e tudo mais (incluindo os direitos autorais).

uma experiência e tanto, acredito eu, principalmente levando em consideração que é a minha estreia “profissional” como diretor. que palhaçada toda essa nomenclatura. o que posso dizer é que pela primeira vez entrarei em cartaz com um espetáculo cuja direção foi assinada por mim. isso é muito. isso é pouco. isso é por si só um transtorno.

cuidado para olhar o espetáculo e não querer mudá-lo por completo. é preciso persistir nas poças, persistir nas apostas e decidir por elas somente após o embate – encontro – com o público (os públicos). não invalidar, quase não julgar, abrir a jaula e deixar o monstro se mostrar.

muitas questões minhas, muitas vontades. sobretudo, um desejo que nasce lá dentro querendo gritar, nascer, fazer vida. quero mostrar esse trabalho. quero que as pessoas vejam. quero viver isto. isto… isto. tão concreto. onde começo. onde termino.

# 31

11 de abril de 2010 – Teatro Gláucio Gill - 10h/13h
dan marins, diogo liberano e natássia vello.

. primeiro ensaio depois de tudo. nos encontramos no gláucio gill. havia enviado o texto por e-mail, para que o dan e a natássia redecorassem. entreguei também uma cópia do DVD, para que lembrassem as marcas, quem sabe as intenções;

. depois de quarenta minutos de atraso o ensaio começou. a natássia havia encontrado seu texto. ou foi o dan. não sei. sei que havia apenas um texto encontrado e que eles haviam lido ele antes de vir para o ensaio. pedi que me dessem o texto e os pedi o seguinte: que fizessem uma vez, sem o texto, o passadão da peça. eles poderiam se comunicar, mas apenas com falas do texto. um jogo, uma brincadeira como na peça – esforço de repetição, de memória, de retomada;

. não fiquei no ensaio com eles, mas ao término, haviam feito dois passadões e disseram estar mais seguros de tudo, texto, marcas, etc e tal;

. conversamos um pouco sobre as intenções. depois de um tempo de distanciamento, falei com a natássia – principalmente – que sua personagem estava me parecendo por demais violentadora, alguém movido pela vingança. não me parece algo bom para o espetáculo. discutimos um pouco e o investimento agora é compreender que cada ataque que ELA destina a ELE, é como se fosse a ELA também. feri-lo também a faz doer. a morte d’ELE implica a d’ELA. algo a se maquinar;

. dan teve um ideia ótima para o início da peça. algo que durante o processo queríamos ter bancado mas que – principalmente por exigência acadêmica de duração do espetáculo (máximo de 30 minutos) – acabamos por perder. diz respeito ao processo físico de abertura da peça. dan propôs que seu personagem fizesse na abertura da peça toda a movimentação que executa durante toda a peça. em outras linhas, aprovei a ideia pedindo a ele que nos desse a TOPOGRAFIA desenhada por ELE no decorrer de toda a encenação – 30 minutos em 3 – vamos experimentar nos próximos ensaios.

sábado, 24 de abril de 2010

# 30

01 de dezembro de 2009 - ECO/UFRJ - 15h/22h
dan marins, diogo liberano, natássia vello, verônica machado, júlia marini e jéssica baasch.

. escrevo o relatório deste ensaio geral meses depois da estreia. no caderno de ensaios, as anotações são dispersas e dissem respeitos sobretudo a questões técnicas. figurino, cenário, a luz. a angulação dos refletores. a altura de cada um deles. tem escrito AFINAÇÃO;

. comentários da Marina Vianna: assovio e não “assobio”. esse, isto, isso… beckett e seu Inominável. apontamento. natássia (alguns agudos);

. outras anotações soltas: 1ª) vestido na estrutura – BRAÇOS!; 2ª) corte do algodão cru/costura; 3ª) refletores (3) + fiação; 4ª) pés dos refletores e 5ª)…

Que crime tudo isso. Chamei tanto a Júlia quanto a Verônica alguns dias antes. Entreguei à Júlia o vestido de noiva da minha mãe (de dezembro de 1975) e disse algo como “bem, tem isso daqui. acho que pode servir”. E ela usou. Descosturou-o. Rompeu costuras de há décadas. O cheiro de guardado, a história, a cor. Tudo ali, conservado. Em cena. Eternizado.

Não me lembro de muita coisa. Foram coisas demais, no final das contas. Grampos de cabelo que até hoje estão soltas pela minha casa, dentro da mochila, usados como clips. Estresse, desgaste. Quando foi que comi algo naquele dia. Não lembro. A estreia veio e nos levou com ela. Aqui estamos, hoje – 24 de abril de 2010 – prestes a estreiar num teatro na cidade do Rio de Janeiro. Que percurso doido. Que loucura. Que delícia. E que vício.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Do inconsciente coletivo em NÃO DOIS

         
O diretor como espectador de profissão 1.
Há uma intuição amorfa que é minha relação com a peça. Estou convencido de que esta peça precisa ser feita hoje, e sem esta convicção não posso fazê-la. (Brook, 1987)

Em 2007 me deparei, pela primeira vez, com o conceito de intuição amorfa desenvolvido por Peter Brook e colocado em questão pela professora Joana Lebreiro na disciplina Direção III. Lembro-me que neste momento comecei a ter clareza de que aquilo que eu viria a produzir como diretor teatral dizia respeito, em primeiro lugar, ao meu universo particular. Independente do ponto de chegada, a partida derivaria sempre de um ponto de vista particular que buscasse encontrar seu eco num espaço outro. Foi quando passei a dar atenção às minhas intuições e a pensar com mais cuidado sobre o espectador, sobre aquele ao qual eu destinaria a minha produção.

No final de 2008, ao começar a montagem de Direção V sobre o texto PASO-DE-DOS (do dramaturgo argentino Eduardo Pavlovsky), cuja estreia aconteceu em dezembro de 2009, me deparei com a noção de inconsciente coletivo. Na obra Em busca de um teatro pobre, Grotowski afirma: para que o espectador seja estimulado a uma auto-análise, quando confrontado com o ator, deve existir algo em comum a ligá-los, algo que possa ser desmanchado com um gesto, ou mantido com adoração. Portanto, o teatro deve atacar o que se chama de complexos coletivos da sociedade, [...] aqueles mitos que não constituem invenções da mente, mas que são, por assim dizer, herdados através de um sangue, uma religião, uma cultura e um clima (Grotowski, 1968).

A partir dos escritos de Grotowski, desenhei uma “função” para a obra de arte que me interessava: ser ela capaz de gerar em quem se relaciona com ela, alguma autonomia crítica. Para isso, seria inevitável um embate, algum encontro provável entre obra e espectador. Fui então estudar o inconsciente coletivo a fim de esclarecer aquilo que Jung supõe que sejam sedimentos de experiências constantemente revividas pela humanidade (Jung, 1943). Ora, se minhas montagens teatrais se destinavam ao outro, talvez eu devesse buscar entender alguma lógica possível sobre o outro. E, logo, optei que meus exercícios de direção se tornassem embates vivos, mais questionamentos e menos respostas, porque pelo encontro me parecia ser possível evocar no espectador algum esforço individual de compreensão. Mais que isso: evocar no espectador sua(s) maneira(s) de lidar com a obra e, inevitavelmente, sua(s) forma(s) de ler o mundo.

Acabei achando tudo isso pretensioso demais. Mas algo me dizia que era isso sim. Dessa forma, a melhor maneira de encontrar clareza foi se jogar em meio à escuridão. Fui então com minha Direção V experimentar estas intuições por sobre um texto de violência e dependência entre um homem e uma mulher, entre um torturador e uma torturada. Já em processo com os atores, cheguei a um ditado popular que assegurava em si justamente uma leitura que eu queria “atacar”. Uma leitura que precisava ser relativizada, a fim de perder seu posto de verdade universal e configurar-se, naturalmente, como uma possibilidade e não mais como fim, inevitabilidade.


A expressão “quem cala consente” é vista por mim como uma dessas heranças apontadas por Grotowski. Ainda me soa muito ingênua, mas se inscreve, para mim, no âmbito do inconsciente coletivo, pois se configura como uma lógica já instituída e divulgada, mesmo que não compreendida ou aceita. Eu não tenho em mim a clareza de quando comecei a acreditar que quem cala está consentindo. Com a encenação de PASO-DE-DOS (que acabou sendo chamada de NÃO DOIS) construímos uma representação que se esforçava em tornar ruidosas algumas leituras já enraizadas em nosso inconsciente, como a de que o homem é sempre o agressor e a mulher sempre a vítima. Eu não queria os rótulos de torturador e vítima. Eu queria investigar uma construção de personagens que procurasse o seu caráter genuíno, complexo. Ou seja, como haviam se tornado aquilo ali pelo o qual estavam sendo julgados e classificados (torturador e torturada). O meu esforço foi o de escrever, pela encenação, a expressão “nem sempre” dentro da construção “quem cala consente”. Como se quisesse dizer que quem cala – nem sempre – consente. Como se quisesse dizer que a vida persiste em espaços muitas vezes complexos de serem ditos e/ou determinados.

E agora com ESPERANDO GODOT eu acredito que poderei dar continuidade ao que foi iniciado. Parto de outro provérbio que desta vez prega que “quem espera sempre alcança”. Porém, agora, desejo jogar de outra forma. Se em NÃO DOIS eu contrapus a imagem (encenação) ao que estava inscrito no inconsciente (“quem cala consente”), desta vez eu quero que a encenação assegure o que o ditado repete e instaura em nós: o fato de que quem espera acaba, inevitavelmente, por alcançar sua espera. Porém, com a dramaturgia de Beckett, tenho um texto que “defende” a espera e anula a possibilidade da chegada. Mas é pelo embate texto/encenação que pretendo problematizar essa impossibilidade da chegada. Será mesmo que não é possível que Godot chegue? O embate, mais uma vez, torna-se necessário para que se descubra – por nós, neste momento – o valor da espera, quais são suas qualidades e como ela se movimenta. Não importa Godot chegar. Importa especular sobre como o ser humano está fadado a uma busca por preenchimento – esta sim – difícil de aportar. (Para saber mais sobre a montagem de ESPERANDO GODOT, acesse desesperandogodot.blogspot.com).



1. Título de um artigo escrito por Jerzy Grotowski.
          

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Em 2010...

Bom, 2010 acordou. Fizemos nossa estreia no ano passado, em dezembro, parece muito, mas foi apenas  há pouco mais de um mês. A peça precisa se testar, se quebrar, bater de cara com os públicos, se recriar.

Por isso, toda vez que sento para pensar se é necessário já fazer alguma alteração, acho que me surpreendo, porque não. Não devo pensar assim sobre alterar a obra. Devo me surpreender com a surpresa da alteração, com o tamanho da necessidade. O diálogo agora com os atores será pelo essencial. Que movimento é aquele que ficou mais perto? Ele quem reinvindicou essa aproximação? [...] Quero ver a peça falando sozinha.

Daí eu escrevo 'peça' e o tempo de duração me dá uma estremecida. É uma peça? É um esquete? É o quê? Gente, é uma peça. Sua duração é de trinta e cinco minutos. Não há outra colocação que possa ser feita. É uma experiência para a qual convidamos o espectador, qualquer um, e vejamos o que este encontro pode gerar. Duração não é definição de gênero, não é definição de nada (exceto do tempo).

No mais, uma imagem para sugerir a necessidade do encontro.